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Discurso de garantia da liberdade de expressão é manipulado para ocultar interesses de big techs

Por Alexandre Aragão

24 de abril de 2024, 18h41

“Às vezes o plenário funciona assim. Você usa uma bandeira — por exemplo, liberdade de expressão — para defender o interesse econômico de quem você representa”, explicou o presidente da Câmara, Arthur Lira (PP-AL), ao comentar o PL 2.630/2020 no Conversa com Bial da última terça (23).

Com didatismo, Lira admitiu a derrota no “PL das Fake News”: “É uma pauta que eu não consegui vencer, que os líderes não conseguiram vencer, porque ela é afeita a cada um”, disse, imitando o gesto de quem mexe no celular. “Cada um que usa a sua internet hoje, Bial, interpreta de uma maneira. E aí vem todo um contexto por trás.”

O manejo malicioso do discurso de defesa da liberdade de expressão não serve apenas para barrar iniciativas legislativas de interesse do país. Ele também não é exclusividade do Brasil, como exemplificou o relatório sobre o X (ex-Twitter) apresentado pelo Congresso dos Estados Unidos.


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Os documentos sigilosos que a empresa compartilhou e os parlamentares americanos divulgaram não ajudam a contar a história que eles próprios expressam como se fosse verdade. É mentira que o ministro Alexandre de Moraes lidera uma escalada para censurar a oposição política no Brasil.

Os ofícios mostram que nem todos os bloqueios foram por iniciativa do Judiciário e que nem todos os casos são relacionados a eleições.

Ao menos quatro perfis citados no relatório foram bloqueados por iniciativa própria do X, em todo o mundo — algo que a Justiça brasileira não pode determinar —, após descumprirem regras da plataforma. Entre as contas, há duas do ex-deputado Daniel Silveira e uma do foragido Allan dos Santos. Leia a reportagem completa.

Outra reportagem do Aos Fatos revelou ainda que Moraes pediu o bloqueio de contas no X por conteúdos relacionados ao inquérito que apura o assassinato de Marielle Franco e Anderson Gomes.

O inquérito está sob sigilo e não há informações sobre a data da decisão repassada pelo X ao Congresso dos Estados Unidos. No entanto, é possível saber a data de abertura do inquérito — 20 de março deste ano —, dias antes da prisão dos acusados de serem mandantes do assassinato, os irmãos Domingos e Chiquinho Brazão.

Após um relatório da Polícia Federal afirmar que o X burlou decisões judiciais ao permitir que perfis suspensos fizessem lives — como mostramos na semana passada —, os conteúdos foram bloqueados para acessos a partir do Brasil, um indício de que, no fim das contas, a empresa respeita o que a Justiça decidir, ao contrário das diatribes de Elon Musk.

Tanto parlamentares como figuras públicas estão sujeitos a “usar uma bandeira”, como diria Lira, “para defender o interesse econômico de quem representam”. Fosse uma bandeira física, de tecido, a defesa da liberdade de expressão estaria puída de tanto estica-puxa oportunista.

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