🕐 ESTA REPORTAGEM FOI PUBLICADA EM Dezembro de 2018. INFORMAÇÕES CONTIDAS NESTE TEXTO PODEM ESTAR DESATUALIZADAS OU TEREM MUDADO.
Tudo o que você precisa saber se ainda quiser sobreviver às discussões familiares no fim do ano
Você, caro leitor do Aos Fatos, ainda tem disposição de discutir política? Não pretende ignorar o elefante na sala durante a ceia? Acredita que o milagre de Natal vai estimular discussões civilizadas em família? Pois o Guia Aos Fatos de Sobrevivência às Discussões Familiares de 2018 pode ajudar. Trata-se da já tradicional seleção das nossas mais polêmicas checagens para que você, grande diplomata, embaixador da verdade, o elo perdido, possa enfrentar o suplício das discussões familiares com dados confiáveis.
O nazismo é de esquerda?
Não, não é.
O futuro ministro do Meio Ambiente, Ricardo Salles (Novo), publicou em setembro deste ano um artigo na plataforma Medium em que sustenta que o nazismo era parte da esquerda e classificou o movimento liderado por Adolf Hitler de “socialismo de preto” (em um paralelo com o comunismo, que seria o “socialismo de vermelho”).
A informação, claro, é falsa, mas chegou a circular com tal força que a Embaixada da Alemanha no Brasil fez um vídeo explicando a história do nazismo naquele país em que explica que o movimento era uma ideologia cunhada na extrema-direita: "devemos nos opor aos extremistas de direita, não devemos ignorar, temos que mostrar nossa cara contra neonazistas e antissemitas".
Da mesma maneira, pesquisadores refutam completamente esse argumento. À BBC a antropóloga Adriana Dias, da Unicamp, explica: "O nazismo e o fascismo diziam que não existia a luta de classes — como defendia o socialismo — e, sim, uma luta a favor dos limites linguísticos e raciais. As escolas nacional-socialistas que se espalharam pela Alemanha ensinavam aos jovens que os judeus eram os criadores do marxismo e que, além de antimarxistas, deveriam ser antissemitas".
"Tanto o nazismo alemão quanto o fascismo italiano surgem após a Primeira Guerra Mundial, contra o socialismo marxista — que tinha sido vitorioso na Rússia na revolução de outubro de 1917 —, mas também contra o capitalismo liberal que existia na época. É por isso que existe essa confusão", afirmou também à BBC Denise Rollemberg, professora de História Contemporânea da UFF (Universidade Federal Fluminense).
Mulheres trabalham mais que homens?
Segundo o estudo Síntese de Indicadores Sociais do IBGE de 2015, em 2004, somando-se a ocupação remunerada e os afazeres domésticos, as mulheres trabalhavam quatro horas a mais do que os homens por semana. Em 2014, a dupla jornada semanal feminina já possuía cinco horas a mais.
O 'kit gay' de fato existe? Foi criado por Haddad?
O chamado “kit gay” é, na verdade, o projeto Escola Sem Homofobia, produzido em 2011 por organizações de defesa da população LGBT em convênio com o FNDE (Fundo Nacional de Desenvolvimento da Educação), uma autarquia do Ministério da Educação, à época sob gestão de Fernando Haddad. A verba para o projeto — cerca de R$ 1,9 milhão — foi obtida por meio de uma emenda parlamentar da Comissão de Legislação Participativa do Congresso Nacional.
O objetivo nunca foi promover qualquer tipo de sexualização, mas a aceitação e a inclusão da população LGBT. Composto de três vídeos, seis boletins e um caderno com orientações para os educadores, o material não era destinado “a crianças de seis anos”, mas a estudantes do ensino médio, adolescentes e pré-adolescentes. Duas das peças audiovisuais contidas no projeto tinham classificação indicativa a partir de 11 anos, e uma era livre. Ainda assim, o caderno do Escola Sem Homofobia recomendava aos educadores “assistir/ouvir e verificar se o material é adequado à reflexão sobre o tema e a seu público”. As atividades também eram propostas como sugestões, e não parte de uma disciplina obrigatória.
O livro “Global Study on Homicide” (Estudo Global sobre Homicídio, em português), de 2011, demonstra que não se pode estabelecer relação direta entre o acesso às armas de fogo e os índices de homicídio. Logo na página 10, lê-se que, por mais que essa relação seja complexa, “as armas de fogo, indubitavelmente, conduzem aumentos de homicídios em certas regiões”.
No artigo Effects of Policies Designed to Keep Firearms from High-Risk Individuals, os pesquisadores Daniel Webster e Garen Wintemute, ao avaliar estudos publicados entre 1999 e 2014, encontraram evidências que regras mais rígidas de porte de armas estão associados a menores taxas de violência. Os pesquisadores também destacam o fato de os Estados Unidos terem taxa de homicídio seis vezes maior do que a taxa média entre países desenvolvidos e que essa discrepância norte-americana com relação aos países ricos ocorre apenas com relação às taxas de homicídio por armas de fogo. A taxa de assassinatos causadas por arma de fogo nos Estados Unidos é 20 vezes maior do que a média registrada em países de alta renda.
No artigo The Transmission of Gun and Other Weapon-Involved Violence Within Social Networks dos pesquisadores Melissa Tracy, Anthony Braga e Andrew Papachristos, foram analisados 16 estudos publicados entre 1996 e 2015. A análise indicou maior risco de vitimização ou de execução de crimes por pessoas expostas à violência armada. Os pesquisadores também destacam que, apesar de haver registro de redução dos homicídios causados por armas de fogo nos Estados Unidos nas últimas duas décadas, a violência armada continua sendo o principal fator para mortes violentas no país, com 11 mil mortes por arma de fogo em 2013 e 62 mil lesões não-fatais no mesmo período.
Não há qualquer evidência de que as urnas eletrônicas foram fraudadas em qualquer época desde a sua adoção pelo Tribunal Superior Eleitoral em 1996. Várias teorias da conspiração surgiram durante este ano em relação à segurança do voto computado nas urnas — como a que narrava um ataque hacker, a que afirmava que os aparelhos autocompletavam votos em Haddad, e que o diretor da OEA (Organização dos Estados Americanos) havia detectado fraude no sistema —, mas todas se provaram falsas.
Em 2014, o PSDB pediu uma auditoria nas urnas após o então candidato Aécio Neves ser derrotado no pleito presidencial, mas não identificou fraudes. No relatório, divulgado em novembro de 2015, o partido diz não ter identificado fraudes no pleito, mas ressaltou que o "sistema eletrônico de votação do TSE não foi projetado para permitir uma auditoria externa e independente dos resultados que publica". Uma das recomendações do documento foi a adoção de um registro impresso do voto.
Apesar de as urnas estarem no centro das discussões sobre fraude eleitoral, esse crime tem sido cometido por um meio mais antigos: a compra de votos. Em 2018, 53 municípios tiveram que refazer eleições municipais por conta de irregulares nas campanhas de prefeitos eleitos em 2016, incluindo compra de votos. Na esfera estadual, o Amazonas realizou uma nova eleição em junho de 2017, após a cassação do então governador José Melo (PROS), condenado por compra de votos.
Por mais que existam estudos que sugerem que o consumo de maconha por adolescentes pode diminuir sua capacidade mental, há outras pesquisas que mostram o contrário: em 2016, um artigo da Academia Nacional de Ciências dos Estados Unidos estudou a influência da erva em gêmeos e constatou que foram encontradas “poucas evidências para sugerir que o uso de maconha adolescente tem um efeito direto sobre o declínio intelectual”. Para haver declínio na capacidade mental, no entanto, os pesquisadores procuram evidências em usuários persistentes dessa droga.
Já o professor Wayne Hall, da King's College, no Reino Unido, mostrou em 2014 que "aproximadamente 9% das pessoas que já usaram maconha se tornaram dependentes, contra 32% para nicotina, 23% para heroína e 15% para o álcool".
A UNODC, departamento de monitoramento de drogas da ONU, defende o que se convencionou chamar de Regra 80/20 — baseada no Princípio de Pareto — , segundo a qual 80% dos usuários de drogas no mundo consomem 20% das drogas disponíveis no mercado, enquanto 20% dos usuários consomem 80% dos psicoativos mundialmente. Isso significa que grande parte dos usuários de drogas são pequenos consumidores, indicando níveis baixos de demanda e, por consequência, pouco descontrole.
Também não é possível afirmar categoricamente que sim. Por mais que o consumo de maconha traga riscos à saúde, como o aparecimento de sintomas de bronquite crônica e interferências em funções cognitivas e motoras, ainda não é possível correlacionar o câncer com a droga. Segundo o estudo de 2015 “An epidemiologic review of marijuana and cancer: an update”, da revista Cancer, Epidemiology, Biomarkers & Prevention, que reuniu 34 estudos epidemiológicos sobre maconha e câncer, não há como ter certeza se o consumo aumenta o risco de contrair a doença.
Um estudo deste ano, publicado na revista americana Chest, revisou outros artigos que tratam somente da correlação com doenças do pulmão. Segundo o artigo, “um grande estudo de corte e uma análise conjunta de seis estudos de caso bem realizados não encontraram evidências de uma ligação entre o fumo de maconha e o câncer de pulmão”.
Os dois estudos citados apontam que os riscos só serão realmente conhecidos quando forem realizadas mais pesquisas em comunidades onde o acesso a droga é maior (como acontece com o cigarro de tabaco, por exemplo).
O auxílio reclusão, chamado por alguns de “bolsa presidiário”, é um benefício que existe desde 1933, mas que só ganhou esse nome em 1960, durante o governo de Juscelino Kubitschek. Recorrentemente utilizado em boatos — como o que dizia que cada filho da pessoa presa teria direito a uma bolsa —, o auxílio está na Constituição e funciona da seguinte forma: se o indivíduo preso, na data da prisão, estivesse trabalhando e contribuindo regularmente para o INSS, seu regime for fechado ou semiaberto e seu último salário de contribuição não exceder o teto previsto na legislação (atualmente R$ 1.319,18), seu cônjugue ou um de seus dependentes recebe um valor calculado a partir das contribuições previdenciárias que o preso realizou. Sendo assim, o auxílio varia de preso para preso e não possui um valor fixo, como traz a imagem viral.
Em alguns casos, o valor pode exceder o teto: como são utilizadas todas as contribuições previdenciárias que o segurado realizou, mas retiradas as 20% menores, a média aritmética dessa conta, que corresponde ao valor do benefício, pode ultrapassar os R$ 1.319,18 atuais.
Além disso, a duração do benefício também varia de caso para caso, indo de quatro meses (em casos em que o cônjuge ou cônjuge separado recebia pensão alimentícia) até vitalícios (em casos em que o dependente, na data da prisão, possuía mais de 44 anos).
De acordo com os dados do Ministério da Previdência Social, em 2016, o governo desembolsou R$ 44,2 milhões e emitiu 46 mil auxílios reclusão (uma média de R$ 943 por auxílio). Não é possível saber, com exatidão, quantos dependentes receberam o benefício, já que o número varia mensalmente. Um estudo do Contas Abertas, de 2016, estimou que apenas 7,1%das famílias dos encarcerados recebe o auxílio.
O auxílio reclusão começou a ser mais discutido após a apresentação da PEC 304/2013, de autoria da deputada Antônia Lúcia (PSC-AC). O texto queria extinguir o auxílio da Constituição porque acreditava que “é mais justo amparar a família da vítima do que a família do criminoso”.
E as mamadeiras eróticas distribuídas em creches? De fato existiram?