Fabio Rodrigues Pozzebom/José Cruz/Agência Brasil

🕐 ESTA REPORTAGEM FOI PUBLICADA EM Junho de 2019. INFORMAÇÕES CONTIDAS NESTE TEXTO PODEM ESTAR DESATUALIZADAS OU TEREM MUDADO.

No Dia Mundial do Meio Ambiente, checamos seis declarações do governo Bolsonaro sobre o tema

Por Bruno Fávero

5 de junho de 2019, 14h33

Depois de ameaçar acabar com o Ministério do Meio Ambiente quando era candidato, o presidente Jair Bolsonaro voltou atrás, mas sua gestão seguiu acumulando controvérsias na área: tirou poderes da pasta, cogitou sair do Acordo de Paris, criticou e mudou regras de multa do Ibama e questionou o trabalho de ONGs que atuam na Amazônia.

O resultado foi uma forte reação contrária de políticos, ativistas e especialistas no mundo todo. Uma frente inédita com todos os ex-ministros do Meio Ambiente brasileiros acusou o governo de promover um desmonte da pasta. A Alemanha, doadora de um fundo de conservação da Amazônia, ameaçou parar de contribuir. E mais de 600 cientistas europeus assinaram um documento em que pedem que a União Europeia pare de comprar produtos brasileiros que agridam o meio ambiente.

Pensando nisso, neste 5 de junho, Dia Mundial do Meio Ambiente, Aos Fatos checou seis declarações de integrantes do governo sobre o tema.

Veja abaixo o que checamos:

1. É falso o argumento do ministro Ernesto Araújo (Relações Exteriores) de que o aumento nas temperaturas da Terra seria uma distorção causada pela proximidade das estações meteorológicas com as cidades. Essa possibilidade foi refutada por um amplo estudo feito em 2011 pelo grupo Berkeley Earth;

2. Não é verdade que o Brasil é o país que mais preserva o meio ambiente, como disse o presidente Jair Bolsonaro. O país é apenas o 30º que mais protege suas florestas, segundo com o Banco Mundial, e o 69º no ranking de sustentabilidade Enviromental Perfomance Index;

3. Cerca de 60% do território brasileiro é coberto por florestas, de acordo com o Banco Mundial e com o Serviço Florestal Brasileiro. E não apenas 30%, como afirmou o presidente Bolsonaro;

4. O ministro do Meio Ambiente, Ricardo Salles, afirmou que proprietários de terras na região amazônica devem ser compensados por não poderem explorar seus terrenos e deu como exemplo de restrição a chamada Moratória da Soja. A declaração é imprecisa porque a moratória é um acordo voluntário assinado por exportadores, não uma regulação governamental;

5. Salles acerta ao dizer que resíduos sólidos das cidades geram gases do efeito estufa. Em 2017, eles foram a fonte do equivalente a 46,8 milhões de toneladas de CO² no Brasil. Isso, porém, é apenas 2,3% do total que o país gerou;

6. O ministro também está correto ao afirmar que o desmatamento da Amazônia vem aumentando no Brasil desde 2012. A taxa anual de desflorestamento foi de 4.575 km² naquele ano para 7.900 km² em 2018. Há sinais, contudo, de que a prática tenha crescido ainda mais no governo Bolsonaro.


FALSO

Nos Estados Unidos, foi feito um estudo sobre estações meteorológicas, e diz que muitas estações que, nos anos 30 e 40, ficavam no meio do mato, hoje ficam no asfalto, na beira do estacionamento. É óbvio que aquela estação vai registrar um aumento extraordinário da temperatura, comparado com a dos anos 50. E isso entra na média global. — Ernesto Araújo (Relações Exteriores)

O argumento de Ernesto Araújo, exposto em audiência na Câmara dos Deputados, de que a medição do aquecimento global é distorcida pela localização das estações meteorológicas já foi refutado por pesquisadores.

O maior estudo sobre o assunto foi publicado em 2011 pelo grupo de pesquisa independente Berkeley Earth, como apontou o colunista da Folha de S. Paulo Reinaldo José Lopes.

Na pesquisa, os cientistas coletaram dados de 36.869 estações meteorológicas entre 1950 e 2011 e mediram separadamente a evolução das temperaturas em áreas rurais e urbanas (neste segundo grupo são incluídas também áreas que já foram rurais e que, ao longo da medição, se urbanizaram – fenômeno a que Araújo se referiu).

A conclusão foi que as estações meteorológicas nas áreas rurais captaram o mesmo ritmo de aumento nas temperaturas do que aquelas localizadas em áreas urbanas – no geral, uma taxa de aquecimento de 0,96 ºC / 100 anos –, o que derruba a hipótese levantada pelo ministro.

Abaixo, o gráfico da esquerda elaborado pelos cientistas mostra, em azul, a evolução da temperatura em áreas rurais e, em vermelho, da temperatura geral. No da direita, a diferença entre as duas medições, que tende a zero.

As conclusões são similares às de outras equipes de pesquisadores como das americanas Nasa e Noaa (Administração Oceânica e Atmosférica Nacional) e da britânica CRU (Unidade de Pesquisa Climática).


FALSO

Somos o país que mais preserva o meio ambiente. — Jair Bolsonaro

Bolsonaro deu essa declaração no Fórum Econômico Mundial, em Davos, em janeiro deste ano. Como o país não aparece na primeira colocação nem na porcentagem de área florestal preservada, nem no ranking mundial de sustentabilidade, não é possível dizer que o Brasil é o país que mais preserva o meio ambiente.

Se Bolsonaro estiver falando de área de florestas preservadas, o Brasil ocupa a 30ª posição. Em 2015, segundo o estudo do Banco Mundial, o país possuía 59,9% de sua área preservada. Os países que possuem a maior porcentagem de área preservada são Suriname (98,3%), Micronésia (91,8%) e Gabão (89,3%). Países como a Suécia (68,9%) e o Japão (68,5%) também estão acima do Brasil.

A afirmação continuará incorreta mesmo se o presidente se referir ao grau de sustentabilidade do país. O Brasil, no último Enviromental Perfomance Index, apareceu na 69ª posição. Nas primeiras colocações estão a Suíça, a França e a Dinamarca. O estudo é feito pelas universidades norte-americanas Yale e Columbia, em colaboração com o Fórum Econômico Mundial, e utiliza 24 indicadores — entre eles a emissão de gases, a proteção da biodiversidade e a porcentagem de água potável — para fazer um ranking de 180 países.


FALSO

30% do nosso território são florestas. — Jair Bolsonaro

O presidente citou esse dado na sessão de perguntas e respostas que seguiu seu discurso no Fórum Econômico Mundial, em Davos, em janeiro. Na verdade, a proporção de florestas que cobrem o território nacional é o dobro do mencionado por Jair Bolsonaro. Segundo dados de 2015 do Banco Mundial, que têm como fonte a Organização das Nações Unidas para Agricultura e Alimentação, o Brasil tem 59% de seu território coberto por florestas — são 4,9 milhões de km².

Já segundo dados do Serviço Florestal Brasileiro, cerca de 61% do território nacional é coberto por vegetação nativa, distribuída nos cinco biomas: Amazônia, Caatinga, Cerrado, Mata Atlântica, Pampas e Pantanal.


IMPRECISO

Mas a Moratória da Soja diz que não pode desmatar na Amazônia Legal. [...] Quando você [governo] impede o livre usufruto da propriedade e do direito de produzir você tem que automaticamente colocar à disposição da sociedade um instrumento de compensação financeira para esses produtores. — Ricardo Salles (Meio Ambiente)

Diferentemente do que Salles dá a entender, a Moratória da Soja é um acordo voluntário assinado por exportadores do grão, não uma legislação imposta pelo governo aos produtores.

Segundo o documento, associados da Abiove (Associação Brasileira das Indústrias de Óleos Vegetais) e da Anec (Associação Nacional Dos Exportadores de Cereais) se comprometem a não comercializar soja plantada em áreas desflorestadas da Amazônia.

O acordo foi assinado pela primeira vez em 2006 e vinha sendo renovado anualmente até 2016, quando passou a ter prazo de vigência indefinido.

Além do setor privado, participam do chamado Grupo de Trabalho da Soja (GTS) representantes do Ministério do Meio Ambiente e de ONGs.

Segundo o Greenpeace, a moratória ajudou a reduzir em 86% o desmatamento provocado pelo plantio de soja na região amazônica. Um estudo publicado na revista Science também mostrou que os produtores são cinco vezes mais propensos a violar o Código Florestal do que a Moratória da Soja.


VERDADEIRO

Um exemplo concreto: como é que você vai tratar os resíduos sólidos no Brasil? Os resíduos sólidos são responsáveis por emissões de gases do efeito estufa. — Ricardo Salles (Meio Ambiente)

O ministro do Meio Ambiente falava, em entrevista ao jornal O Globo, sobre a importância de elaborar e financiar uma agenda ambiental não só para o campo, mas também para as cidades, que sofrem com a falta de tratamento de esgoto e destinação adequada do lixo.

Ele está correto ao afirmar que resíduos sólidos emitem gases que contribuem para o efeito estufa, ainda que em uma proporção muito menor que outras causas, como desmatamento e agropecuária. Em 2017, eles foram responsáveis pela emissão 46,8 milhões de toneladas de gases, segundo o Sistema de Estimativas de Emissões de Gases de Efeito Estufa (Seeg). Esse volume representa apenas 2,3% do total de emissões do país.

Já resíduos decorrentes do tratamento de efluentes líquidos (esgoto) somaram outros 43,5 milhões de toneladas de gases no período, ou 2,2% do total.

Os maiores responsáveis pelos gases estufa no Brasil são a mudança no uso das terras (como desmatamento de florestas, por exemplo), com 46%, a agropecuária, com 24%, e a energia, com 20,8%.


VERDADEIRO

Quanto ao risco de aumento de desmatamento, ele remonta há mais de sete anos, cuja curva de crescimento se iniciou em 2012, portanto durante administrações anteriores. — Ricardo Salles (Meio Ambiente)

A informação citada por Salles em entrevista ao jornal O Globo está correta e foi mencionada em resposta a críticas que recebeu de todos os ex-ministros do Meio Ambiente vivos, que, em maio, divulgaram um manifesto em que acusam o governo Bolsonaro de promover um desmonte da pasta e alertam para um "risco real de aumento descontrolado do desmatamento na Amazônia".

Como exposto por Salles na entrevista, depois de chegar ao ponto mais baixo da história em 2012, no governo Dilma Rousseff (PT), o desmatamento da floresta amazônica no Brasil voltou a subir nos anos seguintes. Em 2012, 4.575 km² de mata nativa foram destruídos. Em 2013, ainda sob Dilma, esse número subiu 28,3%, para cerca de 5.891 km². Em 2018, no governo Michel Temer (MDB), o desmatamento chegou ao ponto mais alto desde 2008, com 7.900 km² – aumento de 14% em relação a 2017.

Mas há evidências de que o desmatamento pode estar aumentando a um ritmo ainda mais acelerado. Um levantamento da ONG Imazon, que monitora a floresta, aponta que houve um aumento de 20% na área desmatada entre agosto de 2018 e abril de 2019 na comparação com o mesmo período do ano anterior.

Uma reportagem do jornal O Estado de S. Paulo também mostrou que maio teve a maior taxa de desmatamento em uma década, com 68,8 km² destruídos em apenas 15 dias, o dobro da área desmatada no mesmo período em 2018. Apesar disso, ainda segundo o jornal, o número de multas aplicadas pelo Ibama caiu 35% desde janeiro.

Referências:

1. Câmara dos Deputados
2. Berkeley Earth
3. Berkeley Earth
4. Folha de S. Paulo
5. Noaa
6. CRU
7. Yale University
8. Yale University
9. Banco Mundial
10. Ministério do Meio Ambiente
11. Abiove
12. Greenpeace
13. Greenpeace
14. Science
15. O Globo
16.
Aos Fatos
17. Seeg
18. O Globo
19. IEA-USP
20. Imazon
21. O Estado de S. Paulo


Esta reportagem foi publicada de acordo com a metodologia anterior do Aos Fatos.

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