🕐 ESTA REPORTAGEM FOI PUBLICADA EM Abril de 2019. INFORMAÇÕES CONTIDAS NESTE TEXTO PODEM ESTAR DESATUALIZADAS OU TEREM MUDADO.

Meme falseia e distorce dados sobre tramitação de processo de Lula na Justiça

Por Luiz Fernando Menezes

23 de abril de 2019, 15h54

Um meme que circula nas redes sociais traz informações falsas e distorcidas sobre a tramitação do processo do ex-presidente Luiz Inácio Lula da Silva (PT) na Justiça ao sugerir tratamento privilegiado em relação a outros réus.

Não é verdade que a ação sobre o triplex do Guarujá (SP) passou por 44 instâncias, como diz a peça, pois o Judiciário brasileiro tem apenas três mais o STF (Supremo Tribunal Federal), nem que a ação foi analisada por 178 juízes. Tampouco é possível provar que o processo do petista passou na frente de mais de três de milhões de outras ações.

Aos Fatos identificou ainda as mesmas informações enganosas do meme em um tweet de 2018 feito por Henrique Bredda, gestor na Alaska Asset, no Twitter. Na época, em resposta à mesma publicação, ele reconheceu que os números eram “figuras de linguagem e exageros da minha cabeça”.

Posts com esta desinformação denunciados por usuários do Facebook já acumulavam, juntos, mais de 5.000 compartilhamentos na tarde desta terça-feira (23). Essas publicações foram marcadas por Aos Fatos com o selo FALSO na ferramenta de verificação disponibilizada pela rede social (entenda como funciona).


FALSO

A justiça brasileira não é lenta. É você que é pobre. O Lula, que é RICO, teve 145 habeas corpus analisados, mobilizando 178 juízes em 44 instâncias [e] pulando na frente de 3.730.138 processos. Enquanto isso você espera 8 anos para a Justiça decidir que o SUS deve lhe dar o remédio que salvará sua vida.

Por partes, o que checamos:

… [O Lula] teve 145 habeas corpus analisados...

O número de “habeas corpus analisados” citado provavelmente se refere aos 145 pedidos que o STJ (Superior Tribunal de Justiça) recebeu em favor do ex-presidente no dia 10 de julho de 2018. Os documentos eram assinados por pessoas comuns e não foram protocolados pela defesa de Lula, como a peça sugere. Um dia depois, no entanto, 143 deles foram negados pela presidente do STJ, Laurita Vaz. No dia 12, o tribunal já registrava outras 264 solicitações de habeas corpus sobre o mesmo recurso.

… mobilizando 178 juízes em 44 instâncias [e] pulando na frente de 3.730.138 processos...

Não existem 44 instâncias no Brasil. Como já explicado por Aos Fatos anteriormente, a Justiça brasileira tem dois graus de jurisdição e o STJ e o STF, que são considerado por alguns como a terceira e quarta instâncias. São duas instâncias ordinárias: a primeira corresponde ao órgão que analisará e julgará inicialmente a ação apresentada à Justiça. As decisões por ela proferidas podem ser submetidas à apreciação de uma instância superior, a segunda instância, composta por órgãos colegiados que podem reexaminar a matéria.

Os processos podem, ainda, seguir para o STJ e até para o STF, mas estes tribunais só dão palavra final em disputas judiciais no país em questões jurídico-constitucionais.

O ex-presidente Lula é réu em oito ações penais, mas apenas uma concluiu o trânsito em julgado nas duas primeiras instâncias. O primeiro julgamento, na 13ª Vara Federal, em Curitiba, ocorreu em julho de 2017. Na decisão do então juiz Sérgio Moro, Lula foi condenado a nove anos e seis meses pelos crimes de corrupção passiva e lavagem de dinheiro pelo caso do triplex.

A defesa do ex-presidente, então, entrou com um recurso no TRF-4 (Tribunal Regional Federal da 4ª Região). O segundo julgamento ocorreu no dia 24 de janeiro de 2018, exatamente 196 dias após a condenação na primeira instância. Em decisão unânime, o tribunal, formado por três desembargadores, manteve a condenação de Lula e ampliou a pena para 12 anos e um mês de prisão. Lula foi preso em abril do mesmo ano.

Vale ressaltar que Lula teve o processo julgado mais rápido pelo TRF-4 no âmbito da Lava Jato. Segundo o tribunal, a celeridade se deve ao grau de complexidade do caso e não há indícios de que tenha relação com o patrimônio do ex-presidente.

A defesa de Lula, porém, não vê a rapidez do julgamento como um fator favorável. Isso também desmente a afirmação de que o processo do ex-presidente “pulou na frente” de mais de 3 milhões de pessoas: não é possível determinar quantos réus não tiveram seus processos julgados, uma vez que cada caso tem particularidades.

Em relação a outros processos, o presidente do TRF-4, em dezembro de 2017 afirmou, no entanto, que quase metade das apelações criminais da corte foram respondidas em menos de 150 dias.

Após a decisão em segunda instância, Lula pediu recurso especial no STJ, alegando que o TRF-4 contrariou dispositivos de leis federais e que a corte se recusou a analisar novos documentos apresentados pela defesa. O ministro Felix Fischer, negou o recurso por entender que a corte não pode reexaminar provas.

A defesa de Lula, então, recorreu à Quinta Turma do STJ e o julgamento do agravo regimental acontece nesta terça-feira (23).

...Enquanto isso, você espera 8 anos para a Justiça decidir que o SUS deve lhe dar o remédio que salvará sua vida.

Aos Fatos não encontrou informações sobre tempo médio para a Justiça garantir remédios aos pacientes, já que não há prazo definido para medicamentos serem disponibilizados administrativamente. Uma exceção é o caso de pacientes com câncer, que, segundo lei, o SUS (Sistema Único de Saúde) deve iniciar o tratamento em até 60 dias após a emissão do exame patológico.

O meme pode ainda estar se referindo à demora sobre a decisão sobre o dever do Estado de fornecer medicamentos de alto custo não disponíveis na lista do SUS, mas ainda assim, não há como traçar qualquer prazo. A discussão sobre o assunto nas altas cortes começou em 2007 e, segundo o Poder 360, em reportagem publicada em 2017, 26.560 ações estavam suspensas esperando um parecer do STF.

Em abril de 2018, a primeira Seção do STJ estabeleceu critérios para que a Justiça determine o fornecimento de remédios fora da lista do SUS. Essa decisão, no entanto, só afeta os processos judiciais distribuídos a partir da decisão.


A origem. As informações que constam no meme são as mesmas de um texto publicado em julho de 2018 no Twitter pelo perfil @hbredda, de Henrique Bredda, gestor na Alaska Asset, como Aos Fatos verificou. Na própria postagem, no entanto, o autor diz que usou “figuras de linguagem e exageros”:

Procurado por Aos Fatos nesta terça-feira (23), Bredda respondeu, por e-mail, que havia explicado no mesmo tweet que seu texto era uma brincadeira: "Já pensou se tivéssemos 44 instâncias? 4 já são demais".


Esta reportagem foi publicada de acordo com a metodologia anterior do Aos Fatos.

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