🕐 ESTA REPORTAGEM FOI PUBLICADA EM Fevereiro de 2020. INFORMAÇÕES CONTIDAS NESTE TEXTO PODEM ESTAR DESATUALIZADAS OU TEREM MUDADO.

Homem que acusa Lula de ter conta no banco do Vaticano não é diretor da instituição

Por Luiz Fernando Menezes

14 de fevereiro de 2020, 13h48

O vídeo da entrevista de um suposto diácono chamado Jorge Sonnante a um canal de TV argentino tem circulado na internet como se ele fosse o diretor do banco do Vaticano, o que não é verdade (veja aqui). No programa, ele acusa o ex-presidente Lula (PT) e outros líderes da esquerda latino-americana de manterem contas secretas no IOR (Instituto para as Obras de Religião), nome oficial do banco da Santa Sé. Os indícios que Sonnante apresenta não atestam as suas acusações e a instituição negou que os políticos citados sejam correntistas.

O mesmo trecho da entrevista circulou no YouTube e em posts no Facebook no ano passado, mas a falsa atribuição ao diretor do IOR foi feita nesta quinta-feira (13), em publicação do site Presidente Bolsonaro, e acumula cerca de 225 mil compartilhamentos até a tarde desta sexta (14). Este conteúdo e outros com a mesma desinformação foram marcados com o selo FALSO na ferramenta de verificação do Facebook (entenda como funciona).


FALSO

VÍDEO: Diretor do banco do vaticano diz que Lula tem 249 milhões de EUROS.

Não é verdade que o homem que acusa Lula e outros políticos latino-americanos de manterem contas secretas milionárias no banco do Vaticano seja diretor da instituição, como sustenta publicação do site Presidente Bolsonaro. O IOR (Instituto para as Obras de Religião) é chefiado hoje por Gian Franco Mammi, mas quem aparece no vídeo citado pela página é Jorge Sonnante, um suposto diácono que fez as acusações em entrevista ao programa argentino "Ahora com Roxana" em janeiro do ano passado.

No trecho destacado, ele afirma que o petista teria € 249 milhões, mas não há indícios que comprovem isso. O banco também já desmentiu que ele e os outros políticos sejam correntistas.

O IOR afirma atender a dois tipos de clientes: instituições soberanas da Santa Sé, do Estado do Vaticano e entidades relacionadas; institutos, dioceses e outras entidades legais canônicas ou civis do Vaticano. Segundo a instituição informa em seu site, "a característica comum de todos os clientes do Instituto é fazer parte da Igreja Católica ou estar a serviço da mesma". No seu último relatório de finanças, relativo a 2018, o IOR informou ter 14.593 contas, que reuniam € 5 bilhões.

A sala de imprensa da Santa Sé desmentiu ao Aos Fatos que os políticos citados tenham contas no banco do Vaticano. Em janeiro de 2019, o também classificou a acusação como absurda: "o ex-presidente não possui nenhuma conta no exterior".

Para além dos desmentidos, os documentos que Sonnante afirma provar as denúncias já foram verificados como falsos pela agência de fact-checking colombiana Colombia Check, que se concentrou nas acusações da suposta conta secreta do ex-presidente Juan Manuel Santos.

Em 15 de janeiro do ano passado, a agência mostrou inconsistências dos papéis apresentados pelo suposto diácono, como documentos escritos em espanhol, quando o idioma nos ofícios da instituição é o italiano, e erros de tradução. Foram identificados ainda sinais de adulteração de assinaturas nos documentos mostrados durante a entrevista.

A fonte das acusações também é polêmica. Apesar de Sonnante se apresentar como diácono, o Aos Fatos não encontrou provas de que a Santa Sé o reconheça como tal. Documentos postados por ele no Twitter que comprovariam seu trabalho na Cúria Romana de 2013 a 2015 têm ao menos dois erros: tanto o selo “Secretaria de Estado” quanto o carimbo “Secretaria di Stato” erram o nome do órgão, cujo nome correto é “Segreteria di Stato”.

Outra inconsistência é que uma das assinaturas no documento datado de 12 de abril de 2013 é do espanhol Rodriguez Carballo, que aparece com a titulação de arcebispo mesmo tendo sido ordenado para o cargo só em 18 de maio de 2013, cerca de um mês depois.

Lavagem de dinheiro. Ainda que as denúncias sobre contas de políticos latino-americanos não sejam verdadeiras, é importante ressaltar que o IOR já sofreu denúncias de lavagem de dinheiro. Foi só em 2010, com a assinatura de um compromisso internacional feito pelo então papa Bento 16, que o IOR passou a aplicar leis contra a lavagem de dinheiro.

Também foi naquele ano que o banco passou a ser investigado pela justiça italiana, que suspeitava que ele estaria administrando contas anônimas com dinheiro de procedências incertas. Em dezembro de 2018, a corte do Vaticano proferiu a primeira sentença relacionada ao crime de lavagem de dinheiro. Na ocasião, o empresário Angelo Proietti recebeu pena de dois anos e meio de prisão e teve suas contas congeladas.

Outro lado. Aos Fatos tentou, sem sucesso, contatar Jorge Sonnante para comentar a checagem. O site Presidente Bolsonaro e a produção do canal 'Ahora con Roxana' não disponibilizam nenhum contato.

Referências:

1. Vatican News
2. Colombia Check
3. Franciscanos.org
4. Periodico Tribuna
5. Centro Televisivo Vaticano
6. Exame
7. Época
8. G1
9. The Local
10. IOR
11. Vaticano


Esta reportagem foi publicada de acordo com a metodologia anterior do Aos Fatos.

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