Ricardo Stuckert

🕐 ESTA REPORTAGEM FOI PUBLICADA EM Agosto de 2018. INFORMAÇÕES CONTIDAS NESTE TEXTO PODEM ESTAR DESATUALIZADAS OU TEREM MUDADO.

Em debate paralelo, Haddad infla resultados e omite problemas nos governos do PT

Por Bárbara Libório e Luiz Fernando Menezes

14 de agosto de 2018, 16h00

De fora do debate da Band, o PT realizou na noite da última quinta-feira (9) um evento paralelo em São Paulo em que Fernando Haddad, candidato a vice na chapa encabeçada pelo ex-presidente Luiz Inácio Lula da Silva, foi a estrela principal. No evento, o ex-prefeito de São Paulo (2013-2016) e ex-ministro da Educação (2005-2012) exagerou o número de empregos criados pelos governos petistas e omitiu problemas enfrentados pelas administrações lulistas ao citar o crescimento econômico do Brasil naquele período.

Apontado na disputa presidencial como sucessor de Lula, que pode ser declarado inelegível pela Justiça Eleitoral, Haddad também falou da criação de universidades no país e comentou o pagamento da dívida brasileira ao FMI (Fundo Monetário Internacional).

Aos Fatos checou seis declarações de Fernando Haddad no evento do PT. Abaixo, o resultado.


EXAGERADO

[Os governos do PT] Fizeram a economia crescer em média 4% ao ano.

Fernando Haddad referiu-se ao desempenho econômico dos governos petistas para defender que o “patrocínio da melhoria de vida das pessoas mais pobres” reativou a economia brasileira. Se levarmos em conta todo o período no qual o PT governou o país — de 2003 a 2016 (do primeiro mandato do ex-presidente Lula até o impeachment da ex-presidente Dilma Rousseff), a média do crescimento da economia foi de 2,9% (consideramos o período até 2015, já que a ex-presidente deixou o cargo no primeiro semestre de 2016). No governo Lula — de 2003 a 2010 —, a média do desempenho econômico foi de crescimento de 4,1%.

Isso não significa, no entanto, que a economia brasileira não passou por percalços durante o período. Houve ao menos três períodos difíceis:

1. Os efeitos da crise econômica de 2002, quando a inflação, o risco-país e o desemprego aumentaram, e a possibilidade cada vez maior de que o PT vencesse fez o dólar superar R$ 4. À época, ao assumir, Lula adotou um forte ajuste fiscal e a economia se recuperou, engatando um crescimento contínuo até a crise mundial de 2009.

2. A crise financeira dos Estados Unidos, em 2008, teve efeito global. Em 2009, a economia brasileira encolheu 0,9%. O Brasil, no entanto, foi um dos primeiros países a sair da crise. A recuperação começou antes do fim do ano, puxada por medidas de estímulo ao consumo, como a redução de impostos sobre eletrodomésticos da linha branca e automóveis, e ao crédito.

3. Em 2014, os gastos e subsídios do governo já haviam gerado um aumento da dívida pública e do endividamento das famílias. Além dos problemas internos, o cenário externo também se complicou: a desaceleração da economia chinesa levou a uma queda brusca no preço das commodities, que haviam crescido desde o final dos anos 1990 e favorecido a economia de exportação do Brasil. No fim do primeiro governo de Dilma, em 2014, a dívida tinha crescido de 51,3% para 57,2% do PIB. O resultado do governo teve seu primeiro déficit na série histórica do Banco Central, que começa em 2001: R$ 32,5 bilhões. A taxa média de desemprego estava em 6,8%, e chegaria a 8,5% em 2015. A inflação estava em 6,41% e chegaria a 10,67% em 2015. A economia naquele ano cresceu apenas 0,5%, e, em 2015, houve a primeira retração do período: -3,8%. Em 2016, a retração foi de 3,6%.


VERDADEIRO


Governos do PT geraram 20 milhões de empregos no país.

De acordo com a Rais (Relação Anual de Informações Sociais), em 2003, o Brasil tinha 29,54 milhões de empregados formais, e em 2015, último ano completo de governo petista, chegou a 48,06 milhões. No total, portanto, os governos petistas geraram um saldo de aproximadamente 18,5 milhões de empregos.

A Rais disponibiliza, anualmente, o estoque (número de empregos) e a movimentação de mão de obra (admissões e desligamentos). Segundo o IBGE, ela seria o "censo do mercado de trabalho formal". É importante ressaltar que os dados não abrangem o setor informal de emprego.

Se o cálculo fosse feito até 2014, o número se aproximaria mais do citado pelo ex-prefeito: naquele ano, estavam registrados 49,57 milhões de empregos. Sendo assim, de 2003 a 2014, os governos petistas criaram 20,02 milhões de empregos. O número, então, começou a cair porque os desligamentos foram maiores que as admissões no setor formal.

Aos Fatos considerou a informação VERDADEIRA pois os valores são de ao menos 18,5 milhões de empregos, sem contar a criação de vagas informais. Além disso, está dentro das regras editoriais de aproximação de valores.

Atualização. Em um primeiro momento, essa declaração foi considerada EXAGERADA com base nos números do Caged, do Ministério do Trabalho, que mostravam que o saldo dos 13 anos de governo do PT totalizam 14,1 milhões de empregos formais, e não 20 milhões. O Caged não inclui, no entanto, dados do setor público.


VERDADEIRO

O governo Temer deu um reajuste de salário mínimo abaixo da inflação.

De fato, o reajuste do salário mínimo nos dois últimos anos ficou abaixo da inflação. Isso se deu por divergências entre a estimativa do INPC (Índice Nacional de Preços ao Consumidor, pelo qual o valor é reajustado), calculado pelo IBGE, e o número oficial divulgado depois. O salário mínimo é reajustado, por lei, com base em uma conta que leva em consideração a variação do INPC e o resultado do PIB de dois anos antes.

No fim do ano passado, o presidente Michel Temer fixou em R$ 954 o salário mínimo para este ano. Como o PIB de 2016 foi negativo, a alta de 1,81% equivalia à estimativa que o governo tinha para a variação do INPC no ano de 2017 — entre janeiro e novembro, a variação foi de 1,80%. A lei garante que, “na hipótese de não divulgação do INPC referente a um ou mais meses compreendidos no período do cálculo, o Poder Executivo estimará os índices dos meses não disponíveis”. O percentual exato, no entanto, só foi conhecido em janeiro deste ano e foi maior do que o estimado: somou 2,07%. A diferença entre o reajuste dado pelo governo e o INPC acumulado no ano passado equivale a R$ 1,78. Portanto, ao invés de R$ 954, o salário mínimo em 2018 deveria ser de R$ 955,78.

Em 2017, a correção do salário mínimo já havia ficado abaixo da inflação. O valor foi reajustado em 6,48%, ao passo que o INPC acumulado em 2016 foi de 6,58%, representando uma perda de 0,10%. Foi o primeiro aumento abaixo da inflação desde 2003, segundo o Dieese (Departamento Intersindical de Estatística e Estudos Socioeconômicos).

Segundo informou o Ministério do Planejamento, a compensação deste ano será feita em 2019. Além da correção que já será feita — levando em consideração o índice de inflação de 2018 e o resultado do PIB em 2016 — o salário mínimo do ano que vem deve somar um aumento de R$ 1,78.


VERDADEIRO

É o mesmo presidente [Lula] que pagou o FMI.

Por mais que Lula, de fato, tenha pago a dívida bilionária do FMI em seu governo, essa decisão é alvo de críticas de economistas: a dívida para com o fundo, que tinha juros pequenos, foi paga com outros endividamentos, com juros maiores.

O Brasil realmente saldou sua dívida com o FMI (Fundo Monetário Internacional) em dezembro de 2005. O governo Lula pagou os US$ 15,5 bilhões restantes do valor de um empréstimo negociado com a entidade em 2002. Na época, inclusive, o diretor-gerente do Fundo, Rodrigo Rato, elogiou a decisão: "Essa decisão reflete o fortalecimento da posição externa do Brasil, em especial os recorrentes superávits comerciais e de conta corrente e as fortes entradas de capital, que aumentaram muito as reservas e reduziram a dívida externa".

No entanto, o que Haddad não diz é que, para quitar a dívida com o FMI, Lula precisou contrair dívidas internas e externas, como explicado em uma reportagem da Época Negócios: para a quitação de uma dívida que custava apenas 4% de juros, o ex-presidente entrou em outras com taxas muito maiores.

No artigo “A Política Externa Brasileira em relação ao Fundo Monetário Internacional durante o Governo Lula”, publicado na revista científica Revista Brasileira de Política Internacional, essa visão também aparece: “diversos economistas e associações da sociedade civil defenderam que o governo brasileiro teria priorizado o pagamento de uma dívida que não precisava ser quitada naquele momento pelo simples fato de apresentar um taxa de juros bastante baixa (4% ao ano)”.

De acordo com os pesquisadores, a dívida do FMI “foi claramente fundamentada na importância política desse pagamento antecipado”, tanto que o tema era recorrente nos discursos do ex-presidente.

Vale ressaltar que o FMI não é um banco, mas sim uma entidade criada para garantir a estabilidade do sistema monetário internacional. Seus empréstimos são concedidos somente a países com problemas financeiros e para receberem a ajuda, é preciso cumprir algumas metas, como ajuste orçamentário, cortes nos gastos públicos, monitoramento da taxa cambial, etc.


VERDADEIRO

As mulheres são maioria na pós-graduação.

Haddad defendeu as políticas de inclusão para as mulheres no país, destacando o aumento do papel feminino no setor de educação. A declaração do petista é VERDADEIRA porque, segundo dados da Capes (Coordenação de Aperfeiçoamento de Pessoal de Nível Superior) e do CNPq (Conselho Nacional de Desenvolvimento Científico e Tecnológico), as mulheres representam mais da metade dos alunos de mestrado e doutorado no país.

O CNPq é uma agência do Ministério da Ciência e Tecnologia destinada ao fomento da pesquisa científica e tecnológica e à formação de recursos humanos para pesquisa no país. A Capes é uma fundação do Ministério da Educação voltada para a formação de recursos humanos de alto nível em todas as áreas do conhecimento.

Segundo dados da Capes sobre o Sistema Nacional de Pós-Graduação, as mulheres são maioria nessa modalidade no Brasil — os números mais recentes, de 2016, indicam 165.564 mulheres matriculadas e tituladas em cursos de mestrado e doutorado, enquanto os homens somam 138.462, uma diferença de aproximadamente 19%. Na modalidade de mestrado acadêmico, as mulheres somaram cerca de 12 mil matrículas a mais que os homens, e em torno de seis mil títulos a mais foram concedidos a mulheres naquele ano. Já na modalidade de doutorado, houve um total de 57.380 mulheres matriculadas e 11.190 tituladas — os homens somaram 50.260 matrículas e 9.415 títulos em 2016.

Um outro levantamento, da revista online Gênero e Número com base nos dados do CNPq, mostra que nos últimos cinco anos, elas também foram maioria nas bolsas de iniciação científica (55%), mestrado (52%) e pós-doutorado (53%), e empataram com os homens nas bolsas de doutorado (50%). Em 2016, elas eram um pouco mais da metade do total de membros de grupos de pesquisa (51%). As mulheres não são, porém, maioria em todas as áreas: em engenharia, ciências exatas e da terra, por exemplo, os homens ainda estão em maior número.

Em 2016, um outro relatório, do Centro de Gestão e Estudos Estratégicos (CGEE), também mostrou que as mulheres eram maioria entre os doutores brasileiros titulados no exterior em 2014 — mais de 60%.


VERDADEIRO

[Lula] foi o presidente que mais criou universidades.

Como Aos Fatos já mostrou anteriormente, é mesmo verdade que Lula foi o presidente com o maior número de universidades criadas em seu mandato. No total, o ex-presidente criou 14 novas instituições de ensino superior.

A linha do tempo de Criação de Universidades do MEC reúne as instituições fundadas até 2006. Nesse período, Lula já tinha criado dez universidades, igualando-se à marca de Juscelino Kubitscheck (1956-1961). Depois, o petista também inaugurou a UFFS (Universidade Federal da Fronteira do Sul) e a Ufopa (Universidade Federal do Oeste do Paraná), em 2009, e a Unila (Universidade Federal da Integração Latino-Americana) e a Unilab (Universidade da Integração Internacional da Lusofonia Afro-Brasileira), em 2010.

Também foi no governo Lula que foi criado o programa Reuni que, entre outras coisas, aumentou o número de vagas nos cursos de graduação e ampliou as ofertas de cursos. Isso fez com que o número de matrículas em cursos de graduação saltasse de quatro milhões em 2003 para 7,8 milhões em 2016 (um crescimento de 96,5%), segundo o Censo da Educação Superior de 2014 do Inep (Instituto Nacional de Estudos e Pesquisas Educacionais).

Outro lado. Aos Fatos entrou em contato com a assessoria de Haddad para solicitar os comentários do candidato. Até a última atualização desta reportagem, no entanto, não havia recebido resposta.

*Esta reportagem foi atualizada às 21h50 de 14 de agosto de 2018 para correção de informações sobre a criação de empregos nos governos petistas. A declaração, que primeiramente foi classificada como EXAGERADA com base nos dados do Caged, foi considerada VERDADEIRA com base nos dados mais amplos da Rais, como explicado na segunda checagem.


Esta reportagem foi publicada de acordo com a metodologia anterior do Aos Fatos.

Topo

Usamos cookies e tecnologias semelhantes de acordo com a nossa Política de Privacidade. Ao continuar navegando, você concordará com estas condições.