Bruno Tadashi/Fecomercio

🕐 ESTA REPORTAGEM FOI PUBLICADA EM Junho de 2018. INFORMAÇÕES CONTIDAS NESTE TEXTO PODEM ESTAR DESATUALIZADAS OU TEREM MUDADO.

Alvaro Dias erra ao falar de educação infantil e teto de gastos no Roda Viva

Por Luiz Fernando Menezes, Bárbara Libório e Ana Rita Cunha

6 de junho de 2018, 14h00

O pré-candidato à Presidência da República pelo Podemos, Alvaro Dias, foi ao Roda Viva na última segunda-feira (4) e usou dados datados e de outro país para falar de investimento na educação infantil e errou ao dizer o número de países que utilizam uma política de limite de gastos.

Dias é o terceiro entrevistado pelo programa checado por Aos Fatos. Antes, foram os candidatos Ciro Gomes (PDT) e Guilherme Boulos (PSOL). Também foram convidados para o programa Marina Silva (Rede) e João Amoêdo (Novo).


IMPRECISO

US$ 1 investido na educação infantil significa um retorno de US$ 6 a 7.

Essa relação foi dita pelo Nobel de economia de 2000, James Heckman, durante um seminário de 2013 na Câmara dos Deputados, quando ele explicava a experiência do Programa Perry. O programa, que aconteceu na década de 1960 nos EUA, atendeu crianças vulneráveis em idade pré-escolar. De acordo com o economista, cada dólar investido no programa representou uma economia de US$ 7 até a idade de 27 anos e de US$ 13 até os 40 anos. A explicação é que o investimento em uma criança carente na primeira infância aumenta a renda, os índices de saúde e o emprego e diminui a criminalidade. Heckman estudou o programa em 2006 e seu artigo pode ser lido aqui.

O ganho chegou a ser citado por outras pessoas. Flávio Cunha, coautor de vários estudos com Heckman, repetiu uma conta parecida em entrevista ao UOL, em 2017; e a última citação veio no mês passado, quando Tim Evans, diretor de Saúde, Nutrição e População do Banco Mundial, defendeu a priorização dessa faixa etária.

Heckman apresentou outra conta em um encontro, também no Brasil, em 2017: “cada dólar gasto com uma criança pequena trará um retorno anual de mais 14 centavos durante toda a sua vida”, afirmou o pesquisador. Ou seja, até os 27 anos, cada dólar renderia US$ 3,78 e não mais US$ 7. Para ele, é o melhor investimento que existe porque é “mais eficiente e seguro do que apostar no mercado de ações americano”.

Na entrevista ao UOL, Flávio Cunha explicou que, para o investimento funcionar no Brasil, é necessário adicionar à fórmula a valorização dos pais e dos cuidadores das crianças. Além disso, diz que “cada projeto tem de atender às necessidades daquele local. Um programa norte-americano talvez não funcione no Brasil, assim como um programa que atende famílias no interior do Ceará pode não ser boa ideia para São Paulo”.

Quando perguntado quais seriam as três principais medidas que ele tomaria para melhorar a educação no Brasil, Alvaro Dias utilizou esses dados para argumentar por que a prioridade de seu eventual governo seria a educação de crianças de 0 a 6 anos: de acordo com ele, esse ganho de US$ 7 “por si só justifica esse investimento”, mas também significa que haverá influência no desempenho escolar, no desempenho da atividade profissional, na produtividade e até no produto interno bruto do país. Como a conta apresentada por Heckman, além ser datada — referia-se a um programa dos anos 1960 —, também dizia respeito a um outro país, Aos Fatos classificou a declaração como IMPRECISA.


EXAGERADO

O Fundo Monetário Internacional frisou que, de 90 países, 50 deles adotam uma política de teto de gastos porque é necessário o controle dos gastos públicos.

O levantamento a qual Dias se refere é o Fiscal Rules at a Glance, de 2017, que estudou as políticas fiscais de 96 países. A política de teto de gastos é chamada, no relatório, de expenditure rule (de sigla ER), que significa uma política de limitação de despesa, e é dividida em limitação do gasto real (que foi a adotada no Brasil) e outros tipos de limitações.

De acordo com a última atualização do levantamento, 30 países adotam algum tipo de ER — e não 50 como diz o senador. No entanto, se também levarmos em consideração os países que já adotaram a política de limitação de gastos, o número chega próximo ao citado por Dias: 48.

Já se formos levar em conta apenas as nações que adotavam ou já adotaram políticas de limitação do gasto real, o número cai para 14 países: Austrália, Bélgica, Croácia, Dinamarca, Finlândia, França, Holanda, Hungria, Islândia, Israel, Kosovo, México, Peru e Polônia. Dessas, dez ainda adotam as medidas.

Como o senador não fez a distinção entre o tipo de política — e o texto considera também aqueles que já adotaram essas medidas mas já não adotam mais —, Aos Fatos classifica a declaração como EXAGERADA.

Dias usou esse dado como argumento para defender que, se eleito, não vai acabar com a PEC, mas sim revê-la. De acordo com o pré-candidato, o controle do gasto público é necessário, mas não do jeito que foi feito.


VERDADEIRO

Nós tivemos um referendo em que 63% da população optou por revogar o artigo 35, que diz respeito à venda de armas.

Dias refere-se ao plebiscito que ocorreu em outubro de 2005 e estava previsto no próprio texto do Estatuto do Desarmamento. Naquele ano, os eleitores foram questionados sobre o artigo 35 do estatuto que proibia “a comercialização de arma de fogo e munição em todo o território nacional”, salvo exceções previstas em lei, como agentes de segurança.

A proibição do comércio foi rejeitada por 63,94% dos votantes. Com esse resultado, foi revogado o artigo e a venda de armas de fogo e munição é permitida seguindo as regras que constam no estatuto.

O pré-candidato usou o plebiscito como argumento para a legalização da posse de armas no Brasil. No entanto, a votação citada não dizia respeito ao porte de armas, que é regulado principalmente pelo artigo 6 do estatuto, mas apenas à comercialização. Aos Fatos já checou uma declaração parecida na justificativa do projeto que revoga o estatuto do desarmamento.


FALSO

A indústria brasileira já respondeu a 27% das gerações de empregos, os manufaturados. Hoje, próximo de 10%.

Considerando geração de emprego o mesmo que a quantidade de vagas efetivamente criadas no ano, o pico de participação na geração de empregos formais da indústria de transformação — aquela que transforma matéria-prima em bens manufaturados — aconteceu em 2004, de acordo com o dados do Caged (Cadastro Geral de Empregados e Desempregados ), do Ministério do Trabalho e Emprego, considerando a série histórica desde 2000. Em 2004, foram criados 1,8 milhão de empregos, sendo que 30,4% do total de vagas criadas, ou seja 545.665, foram abertas na indústria de transformação.

De 2014 a 2017, o saldo de empregos formais da indústria de transformação ficou negativo, ou seja, o número de postos de trabalho fechados nesse setor superou o de postos abertos. A declaração de Alvaro Dias portanto é FALSA, pois, desde 2014, a participação da indústria brasileira de manufaturados na geração de empregos é nula.

Se considerarmos o estoque de vagas, em 2017, os trabalhadores formais da indústria de transformação representavam 19% dos 37,9 milhões de trabalhadores formais, segundo a Rais (Relação de Informações Sociais) do IBGE. Na série histórica, o pico de participação da indústria no estoque de empregos foi em 1995, primeiro ano da série, quando a indústria representava 21% dos trabalhadores formais. Esses números também não batem com os citados pelo pré-candidato.


VERDADEIRO

Temos 60.000 homicídios por ano.

Os últimos números do Anuário Brasileiro de Segurança Pública, do Fórum Brasileiro de Segurança Pública, mostram que o Brasil teve, em 2016, 61,2 mil mortes violentas. O número corresponde à soma das vítimas de homicídio doloso, latrocínio, lesão corporal seguida de morte e mortes decorrentes de intervenções policiais em serviço e fora, e tem como fontes os dados das Secretarias Estaduais de Segurança Pública e/ou Defesa Social e o Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística, o IBGE. Foi o maior número registrado na história do Anuário.

O Atlas da Violência 2018, lançado nesta terça-feira (5), um dia depois da declaração proferida pelo pré-candidato, mostra um número ainda maior de homicídios: foram 62.517 casos, de acordo com os dados do Ministério da Saúde. Nos últimos dez anos, 553 mil pessoas perderam a vida vítimas de violência no país.

Outro lado. A reportagem entrou em contato com a assessoria do senador mas, até a última atualização, não tinha recebido resposta.


Esta reportagem foi publicada de acordo com a metodologia anterior do Aos Fatos.

Topo

Usamos cookies e tecnologias semelhantes de acordo com a nossa Política de Privacidade. Ao continuar navegando, você concordará com estas condições.